domingo, 20 de setembro de 2009

A amizade epicurista


O sábio busca a amizade (philía), pois ele visa à felicidade, a qual não pode ser alcançada na privação do convívio com amigos e da mútua utilidade (ophéleia) resultante de uma relação amigável. Porém não é com indivíduos participantes da “multidão insensata” que o sábio se ligará afetivamente, mas com seus iguais, que partilham de um mesmo pensamento que se funda no estudo da natureza (phýsis). Pois a philía epicurista consiste em partilhar a vida, sentimentos, e também, uma mesma filosofia.
Α amizade como fundadora das agregações humanas é tão natural quanto à força que une os átomos na composição dos corpos agregados, por isso quando o sábio estuda a natureza ele entende que como certos átomos repelem uns aos outros, alguns homens se distanciam por falta de afinidade e esta se mede pela compatibilidade de pensamento.
É na comunidade de pensamento que se proporciona a utilidade mútua (ophéleia), e, portanto, poderia um sábio ser amigo de um néscio? É evidente que não. Embora toda amizade em si mesma seja desejável, é na utilidade que ela se funda (SV 23), portanto, é necessário que a relação amigável seja simétrica, de modo a que alguém não seja de tal modo sobrepujado pelo companheiro que não possa oferecer-lhe nada que este já não desfrute. É preciso ressaltar que a amizade não é a simples e fria utilização de alguém como instrumento para realizar seus objetivos, pois não é amigo aquele que faz da amizade um comércio e que espera sempre algo em troca dos benefícios que ele proporciona ao outro, nem tampouco é amigo o que separa a amizade da utilidade, tornando-se alguém com o qual não se possa contar no futuro (SV 39), mas é uma necessidade natural e meio para alcançar a felicidade de toda a comunidade. Pois tendo em suas bases a ophéleia ela se sustenta e permanece pelo prazer fruído na vida em comum, onde uma simples conversa entre membros de uma comunidade pode ser tão útil aos participantes dela quanto o mais eficaz remédio contra as dores do corpo, tal como Epicuro relata em sua carta a Idomeneu .
A philía deve ser forte o bastante para nos pormos em perigo por nossos amigos (SV 28), ponto em que Epicuro nos adverte a não aprovar aquele que cria rapidamente laços de amizade, nem aquele que demora em fazê-los, tendo em vista que o primeiro não tem raízes suficientes para se expor ao perigo por um amigo e o segundo pode deixar de ajudar por não se achar ainda na condição de amigo quando vier o momento da dor. Mas o maior auxílio que um amigo pode nos prestar é a confiança de que ele estará pronto a nos ajudar quando dele precisarmos. Assim, a philía claramente contribui para um estado de bem-estar e tranqüilidade sem os quais não poderíamos alcançar a felicidade.
A comunidade epicurista surge com uma alternativa de paradigma para a sociedade decadente de Atenas, onde os habitantes não tinham mais cidadania e poder político: A amizade como fundadora de comunidades em uma organização molecular em que homens se aproximariam de acordo com suas idiossincrasias.

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