quarta-feira, 8 de julho de 2009

Canônica epicúrea


Epicuro, segundo Diógenes Laércio, dividiu a filosofia em três segmentos (X, 29): a ética, a física e a canônica. De toda a vasta obra de Epicuro, apenas três cartas chegaram até os dias atuais, a saber: a carta a Menoiceus, a carta a Herôdotos e a carta a Pitoclés, tendo respectivamente como conteúdos predominantes a ética, a física e a astronomia/meteorologia. Mas a obra de Epicuro que trata especificamente da canônica, a qual tinha por título Cânon (κανων) não foi preservada para a posteridade e o que sabemos da canônica epicúrea se deve principalmente a transcrição feita por Diógenes Laércio (na sua obra intitulada Vidas e doutrinas dos filósofos ilustres) da carta a Herôdotos em que Epicuro fundamenta o conhecimento da natureza (φυσις) através de poucas referências a canônica. Mas o que é canônica? Pretendo esclarecer essa questão simples, mas que não pode ser desmerecida, neste texto em que volto, depois de alguns meses estudando a obra de Epicuro, a comentar a filosofia do jardim.


O termo "Canônica" deriva da palavra grega Cânon (κανων), que pode significar, entre outros significados (segundo o Dicionário Grego-Português e Português-Grego de Isidro Pereira): "molde, princípio", portanto o termo canônica deve ser entendido como o princípio da filosofia, uma introdução à qual todo o desenvolvimento da investigação deve ser moldado, assim como o canôn das escrituras bíblicas deveria se submeter a moldes e regras estabelecidas pelos anciãos, o cânon filosófico de Epicuro deve se submeter às regras e moldes do conhecimento.


A canônica, pois, explicita de que modo obtemos o conhecimento e, claro, o fato de que podemos conhecer. Na carta a Herôdotos Epicuro nos fala que aquilo que conhecemos da natureza deriva do movimento dos átomos que se desprendem dos corpos sólidos e atingem nossos sentidos. As vibrações dos átomos nos corpos fazem com que eles se desprendam, produzindo imagens (ειδωλου) (50) que são capazes de atingir os nossos orgãos sensoriais (αι'σθητηριον), que por sua vez, formam representações (φαντασιαν) em nossa mente, as quais permitem o conhecimento da natureza. Por conseguinte, é necessário outorgar aos sentidos total credibilidade em relação ao conhecimento e admitir que quando erramos não se trata de um falha dos sentidos, mas de uma opinião ou julgamento precipitado.


Observamos que há uma inter-relação entre os segmentos da filosofia de Epicuro, pois a canônica estabelece a possibilidade de conhecer a natureza, mas a própria canônica depende dos conhecimentos físicos para se fundamentar, e o mesmo é visível na ética que depende tanto da física quanto da canônica. Portanto, se há uma divisão na filosofia de Epicuro ela é um expediente utilizado pelos historiadores da filosofia para esclarecer e ordenar melhor o seu objeto de estudo e não uma divisão real no pensamento do filósofo. Espero que este texto tenha sido profícuo no intento de esclarecer um pouco da filosofia epicúrea.

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